Pertencimento

Em uma certa aula de filosofia ou sociologia, lembro bem de ter ouvido de uma colega de curso — mais envolvida, concentrada e participativa do que eu — de que o meu desinteresse como estudante de uma universidade pública, federal, deveria ser avaliado sob a luz de quem financiava meu curso: não só meus pais de classe média, mas também aqueles cidadãos, cujos filhos não tiveram a mesma oportunidade de estudo e que pagavam a dura custa os seus impostos. Isso nunca mais saiu da minha cabeça.

Dos tempos de UFV – Universidade Federal de Viçosa lembro da constante luta por um curso de jornalismo decente. E mais uma série de outros pleitos. Das manifestações no refeitório universitário, apitaço em frente a reitoria e entrada em salas de outros cursos para convocar simpatizantes às mais distintas causas. Fui em algumas, mas sempre estive passos atrás, quase escondido, relutante e sem um sentimento real de pertencimento. Nunca doeu de fato em mim.

Eu faço parte da maioria que estudou em um bom colégio particular e que entrou nas poucas vagas que o ensino superior público oferece. Sei o quanto o dinheiro pago pelos meus pais na minha formação foram fundamentais para o meu ingresso, por eu tirar vagas de quem não teve a mesma oportunidade que eu.

É por isso que hoje eu não só acredito nas cotas como penso que elas deveriam ser ampliadas — não só pela cor da pele, mas sim pela condição social de quem as pleiteia. Universidade pública não deveria ser para quem tem condição de pagar pelo ensino privado, e vice-versa. Só assim começaríamos a corrigir o verdadeiro absurdo de oportunidades (e falta de) que se estabelece em nossa sociedade.

Neste momento será mais fácil pedir e contar com o entendimento das pessoas de que não é certo atrapalhar a aula de outros; de que só quem vive uma situação de marginalização e exclusão sabe o quanto isso é terrível e traumático; de que, no fundo, os dois lados estão certos e errados; e que ninguém vencerá batalha alguma no grito.

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