Tenho 32 anos, mas já tive 3 meses. Minha mãe não foi alvo de abuso sexual, nem pensou em utilizar uma clínica clandestina para me abortar. Minha gestação foi desejada, meu nascimento comemorado. Talvez, não fosse esse o caso, ela tivesse até condição de procurar uma das tantas clínicas particulares que oferecem alguma estrutura, um privilégio neste país de miséria. Quem sabe ainda, envergonhada e sem condição, recorresse a remédios caseiros que colocariam sua vida em risco dentro da própria casa. Acontece e mais do que a gente imagina.
Dizer sim ao aborto não é apoiar assassinatos. É pensar além do discurso óbvio (proteção à vida, do feto) considerando a realidade que se apresenta de forma dolorosa e por baixo dos panos em nossa sociedade. É trazer o assunto para uma discussão mais madura e, ainda assim, ser capaz de proteger a vida de milhares de gestantes que morrem todos os anos por não serem assistidas e devidamente respeitadas em suas escolhas pelo Estado. É zelar para que a futura geração venha ao mundo como nós compreendemos justo: com amor, cuidado, planejamento e condições emocionais para que se formem cidadãos dignos de uma vida.
Talvez seja difícil para nós, nascidos em famílias tão legais, entender o que se passa nessas casas que não tiveram a mesma sorte. E é por isso que eu entendo a campanha “Tenho XX anos, mas já tive 3 meses! #NãoAoAborto #SouAFavorDaVida #TodosContraOAborto” que invadiu o feed de minhas redes sociais desde a decisão do Supremo Tribunal “de que praticar aborto nos três primeiros meses de gestação não é crime“, abrindo um precedente importante para a tratativa do tema. Entendo, mas não concordo. Talvez estejamos sendo idealistas demais em achar que com o nascimento tudo se ajeita e o amor passe a existir… Talvez estejamos pensando mais no feto do que na mulher que o carrega e, talvez, precisássemos primeiro respeitar essa decisão que é tão particular e pode fugir do nosso entendimento.