Chegamos enfim ao tempo presente, não o anunciado como carpe diem, aproveite o dia, mas este do faça, registre e exiba para então perder-se num mar de informações igualmente inúteis e vazias. Já era a chance de sentirmos saudade ou de termos alguma expectativa futura com tantas coisas acontecendo e se atropelando nessa linha do tempo que é novelo embolado de vaidades e egoísmos.
Aplicativos, esses que agora pedem que seja ao vivo, com máscaras, disfarces e uma falsa chance de arrependimento, mostram coisas que não queremos ver. A rotina é enfadonha, dramaticamente chata não importa o filtro com que se emoldure. Cria-se, entretanto, uma falsa sensação de serventia, utilidade, de autonomia e liberdade… É o plantão de uma vida sempre alerta. Domínio ou escravidão?
O apreço pelo que foi vivido vale um deslizar de dedos ou aqueles angustiantes segundos em que os olhos correm por registros não-lineares. É a festa e o show que acontecem dentro do celular, o gosto de um prato saboreado nas retinas, as anilhas com quilos de peso sustentadas na pressão da tela. As experiências se pagam pelo registro, não o do coração, mas de cérebros conectados a nuvens. É rock & post de um delicioso sabor binário em séries de inflexões selfistas.
Desta tamanha vontade de contar sobre o agora e de uma perspectiva tão subjetiva que acaba por só interessar a si próprio, perde-se o charme dos causos de outros tempos construídos no tete a tete. E não precisa ir muito longe… Das salas de bate-papos por dias a fio, das comunidades sustentadas por experiências individuais, dos grupos reunidos em aplicativos de mensagens instantâneas.
É história de um personagem só em momentos de solidão com reforço para mostrar-se vivo: Stories, Moments, Live. Clicamos para uma audiência qualquer e seguimos sozinhos rumo ao desconhecido. Tão afoitos que esquecemos do refinamento que cria pérolas, do cuidado com as arestas que lapida diamantes.
Atropelamos o bom senso, passamos em cima de ponderações cautelosas, do discernimento entre aquilo que divulgamos com paixão (e que importa!) daquilo que se torna material mal digerido, lixo, merda. Mas não importa: sempre, dentro desta nova forma de entender o “sempre”, será possível deletar o que não dura mais do que 24 horas.