Talvez “Kiki – Os Segredos do Desejo” (do original “Kiki, el Amor se Hace“) fosse melhor recebido há uns 20 anos, quando nossa sociedade era mais permissiva a certos tipos de “piada” e bem menos atenta a um discurso intrinsecamente preconceituoso, capaz de gerar ondas de conscientização/problematização sem fim dependendo da forma como cada um encara os temas sensíveis que nos permeiam.
Dark sides nem sempre são fáceis de abordar e é raro não virem retratados de forma sombria. Num dos acertos, o filme aposta em cores quentes e na superficialidade das emoções, mas isso acaba suavizando questões sérias como abuso/estupro de uma pessoa dopada por tranquilizantes, abandono de animais e assaltos ensaiados. Tudo permitido, segundo o roteiro, pelo sentimento que as norteiam – o amor -, acima de qualquer juízo de valor.
Plasticamente lindo, Kiki deixa de oferecer um caminho de questionamentos e reflexões reduzindo dramas e dilemas a um grande conto de fadas, difícil de resistir a tempos de mimimis. Mas mesmo estereotipando fetiches, caricaturando excentricidades, é capaz de divertir se comprada a ideia de desligar-se um pouco da realidade e aceitar a ficção pela ficção.
Resta saber se contornos tão leves e frágeis corroboram ou ajudam a destruir os rótulos do “novo”, “diferente” e “exótico”, com aspas enormes diante a minha ignorância na maioria desses temas. É aquela história, mundo mundo vasto mundo…
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