Facilita a nossa vida a apontar os erros, dizer quem são os culpados, quando se tem um quadro em que a economia vai de mal a pior, sobram reformas impopulares, os políticos são pouco carismáticos e com nomes que soam infantiloides (“Fufuca”) além de uma aparência que parece mais a versão nacional da Família Addams do que o sonhado estereótipo de integridade e eficiência, aquele com gel nos cabelos, tailleur alinhado e de cores sóbrias, terno bem cortado, nó de gravata impecável e discursos impactantes.
Precisamos partir de lá, de uma Brasília pouco promissora a curto prazo, e descer as escadas que nos levam ao quintal de nossas casas, a varanda de nosso apartamento. Que tal começarmos pelos governos estaduais e pelas prefeituras emparelhados a um discurso corrosivo e que reproduzem um script de pouca integridade, constante roubalheira e uma ineficiência sentida nos diferentes tipos de serviços que tocam?
É o hospital, a escola, a polícia militar e civil que não funcionam como deveriam enquanto vereadores, prefeitos, deputados estaduais e governadores enriquecem a olhos vistos. São leitos hospitalares abarrotados de gente a espera de um atendimento que muitas vezes não vem, um sistema educacional capenga que não capacita nossos jovens a uma leitura compreensível do cenário vigente (e, consequentemente, a transformá-lo!), a falta de segurança que expõe o risco de nos tornarmos alvo bastando ter o azar de estar ali no lugar e na hora errados. “Sobreviver”, item de primeira necessidade.
Peço então licença para abrir as portas de nossas casas e mostrar como desrespeitamos uns aos outros continuamente e muitas vezes sem perceber. Precisamos sim meter a colher em brigas de marido e mulher, em filhos que controlam os pais, em pais que resolvem não vacinar seus filhos e abrem espaço para ressurgimento de epidemias erradicadas… É a volta do sarampo, da caxumba, da poliomielite. São jovens que agridem professores, que estão certos de serem uma geração acima do bem e do mal, isentas de qualquer compromisso e responsabilidade para com os demais. São todos os ataques que deferimos contra quem pensa diferente e que está separado de nós por essa tela de computador, de celular ou de tablet.
É fácil falar “deles” e esquecer de “nós”, a nossa parcela de culpa quando infringimos pequenas leis e nos tornamos mais do mesmo. A fila desrespeitada no supermercado, na padaria, no banco, na farmácia, no restaurante. O gato na energia, na água, na tv por assinatura, na internet. O atendimento e o assento preferencial ignorados, a carteirinha estudantil falsificada, o jeitinho errado de levar vantagem e reproduzir sem culpa o que existe de pior na política nacional.
A culpa também é minha e sua. Sem reconhecermos isso, sem de fato aplicarmos fortemente a integridade e a justiça em TODOS os momentos de nossas vidas, não dá para sentarmos esperando algum tipo de transformação. Temer, Fufuca e Maia definem bem um estereótipo de Brasil que precisa mudar urgentemente.