Entender a relação da mídia com o povo brasileiro requer destreza para uma esquizofrenia daquelas. Lados opostos, divergentes, acusam os mesmos jornais, revistas e noticiários de serem coniventes, alinhados ao outro lado, repetindo discursos e se vitimizando diante da cobertura apresentada. Existe sim o nós contra eles, onde nós somos as supostas vítimas indefesas de uma imprensa diabólica produzindo incessantemente conteúdos maquiavélicos.
Enquanto para uns ela é golpista, para outros é vendida, manipuladora; ambos concordam que o que vem escrito, aquilo que é exibido, não os representa e cumpre apenas os objetivos econômicos do grupo aos quais pertencem, geralmente a destruição de um conceito no caso o nosso.
Tirando um outro outro veículo que expõe abertamente o seu lado, reportagens são interpretadas parágrafo sob parágrafo, frame a frame, numa compreensão fracionada, limitada, propositalmente descontextualizada ao gosto do freguês. Mesmo tomando por base uma ou outra coluna ou editorial, dando atenção ao espaço que é dado a um blog pelos grandes portais, fica fácil endossar o discurso da parcialidade e acusar toda uma redação de terem firmado pacto com o demo.
Ora, a Folha de São Paulo é o quintal do Gregorio Duvivier ou a varanda do Kim Kataguiri? A Globo (de tantos artistas que se posicionam aberta e livremente contra o “golpe”) deveria ser interpretada apenas pelo espaço dado as operações da Polícia Federal nos noticiários? Ou ao dar espaço para artistas de esquerda dizerem o que pensam, ela estaria fazendo um jogo de cena? E os programas da mesma emissora que trazem vídeos que falam abertamente em golpe? Onde entram? Em que difere a cobertura copo vazio do Estadão ao governo Haddad da atual leitura que vem sendo feita da gestão “maquiada” de Doria? Dar voz a dois lados opostos não seria justamente o objetivo da grande imprensa?
É curioso que passe despercebido para a maioria o flerte descarado da mídia com o negativismo. Notícias alarmantes, pessimistas, do tipo “é o fim do mundo” costumam atrair mais a atenção, gerar mais cliques e, consequentemente, mais dinheiro do que propagandas de benfeitorias administrativas. Denunciar está no core da função jornalística, criticar também. É isso que ainda mantém empregados milhares de amigos jornalistas Brasil à fora, e quem duvide disso que entre num portal ou compre um jornal do interior para ver como esses vendem sangue. Não tem nada de novo nisso.
A mídia brasileira precisa de uma profunda DR com a sociedade para que entendam que são tão ligados que não dá para saber onde começa um e termina outro. É preciso que não superestimem papeis e responsabilidades de todos os agentes envolvidos. Como disse para uma amiga, ao focar nesse ou naquele grupo como os grandes satãs instaurando o apocalipse a partir do Brasil, perdemos a chance de avaliar o todo e ver como O MUNDO tem se relacionado com a produção de conteúdo. Qual o nosso papel nisso tudo seja divulgando o que acreditamos e também o que não concordamos? Qual a nossa contribuição no crescimento do bolo da descrença e na criação de mitos inalcançáveis?