Esta é a história simples de um garoto com sua risada solta e seu choro incontrolável. Era um garoto… Tinha o espasmo de felicidade que vinha fácil e que contagiava quem estivesse perto. Com ele, elas, as lágrimas chegavam trazendo um evento, uma explosão e a dor que pode acompanhar uma vida para todo o sempre.
Houve o tempo em que ele ria de tudo, de todos, da piada mais sem graça e, principalmente, dos cabelos, da falta deles, no adulto. Uma falha enorme bem no meio da cabeça, como um anjo e sua auréola, e entradas que mais pareciam dois chifres começando ali na testa e ganhando vida nas rodas de conversa dos outros adultos.
Eles comentavam – e riam! -, sempre que o adulto não estava por perto, de outro chifre que ele levava nas noites de quinta-feira. Ele, o garoto, ainda não entendia muito bem aquilo, mas ensaiava uma risada porque gostava do som que ecoava pela sala quando todos pareciam rir no mesmo compasso. Ha-ha-ha. Saía gostoso e do fundo da alma.
Quintas-feira eram dias em que o adulto ficava triste e bebia. E bebia mais. E ficava engraçado falando tudo embolado. E depois ficava, de uma hora para a outra, nervoso, bem nervoso, descontrolado. E todos ficavam com muito medo. E dormiam assustados para acordar com ele bonzinho de novo. Era uma sexta-feira normal ali dentro – na casa, na consciência, na alma. Tinha uma semana inteira para se enganar outra vez aquele adulto com um choro preso na garganta e uma risada, que podia ser vergonha e timidez.
Foi num outro dia, com bem mais palavras na bagagem, que preencheu “malícia” e “traição” no jogo de palavras. Mais esperto, um pouco mais velho, achou que podia brincar como um adulto. Foi uma risada fora de tom, a mão pesada do pai bem no meio da fuça e um choro de vergonha, de medo, de dor, de ter sido repreendido e envergonhado assim na frente de todo mundo. As risadas não pararam com o tapa.
Foi ali que rir e chorar atrelaram uma relação de coexistência. Um não vinha sem o outro, daqui pra lá e de lá pra cá. Irmãos inseparáveis numa vida que era feliz, mas triste. Que tinha lágrimas, mas gargalhadas. E que ganhou uma dose de álcool, duas, cinco, quantas fossem necessárias para deixar ele feliz pra burro, depois chateado pra cacete. Inconformado, revoltado, bravo e com um sono que era fuga, fim e morte. Sonhava com ele criança, via as falhas na própria cabeça – e olha só que engraçado: podia até rir daquilo tudo. E revivia com aquela ressaca boa e de dar dó uma história simples, mas que ele sabia ser complicada quando vista de dentro. Era a perspectiva de dor e de delícia de quem sabe o que é.