O semeador, o reconciliador

Conheço muita gente que depois das eleições não só saiu do grupos de WhatsApp de amigos e família, como abandonou essas relações por manter-se convicta não a uma história de vida, mas a uma situação de estresse passageira. Gente que não fala mais com tio ou primo reaça, bolsominion; com o petista, esquerdista, comunista, lulista.

Toda essa gente que está sempre certa e que não suporta conviver com aquela gente errada, erradíssima, que é burra ou alienada. Essa gente que esvaziou o copo e que fala em construir um mundo melhor, mas que ainda não entendeu-se parte, não o todo da equação.

Falo por experiência própria. Sou um dos que em algum momento jogou a toalha, mas que percebeu a tempo que não há como transferir a incompreensão, o meu descontentamento ou mesmo a minha ira e revolta naqueles que por sangue ou empatia são parte da minha vida.

Sei do esforço descomunal em não deixar que as notícias, os comentários e as piadinhas esvaziem o copo. Ele, o copo e o mundo e as relações e nossas emoções, que se mostram tão frágeis com tanto papo furado, com a confiança que foi estraçalhada, e por corações despedaçados por ler ou ver ruídos de comunicação ou mesmo explosões de preconceito e intolerância distribuídos por aí por quem tanto amamos.

Não sei quais são as frestas por onde escorrem compaixão, tolerância e paciência em sua vida. Não julgo que tenha desistido em algum momento de conviver com quem pensa diferente de você. E sei como parece melhor ignorar, silenciar e excluir para afastar de vez o que nos perturba… Mas a lembrança de como tudo foi um dia ainda tem que tocar algo aí dentro. Essa mesma fagulha precisa varrer tudo como labaredas de fogo em um campo de centeio.

É por isso que atravesso os dias repetindo para mim mesmo que não vou perder a fé, que vou continuar a acreditar não só em mim, na minha capacidade, mas que em cada uma das ações de outras pessoas residem as melhores intenções, ainda que incompreensíveis à primeira vista.

É a forma de encarar as diferenças, de superar as frustrações e de manter o elo fortalecido. Ainda que nos termos mais banais, criar pontes de simpatia e seguir em frente semeando apenas coisas boas ao nosso redor.

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